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Fim da isenção tributária para livros prejudica cultura e educação

Isento do pagamento de tributos, mercado editorial, que já está em crise, poderá ver a piora do cenário caso a medida seja aprovada

A Reforma Tributária entregue pelo Governo Federal em julho deste ano tem gerado polêmica entre diversos setores da sociedade, entre eles o mercado editorial. Na proposta, a unificação de três impostos (Pis/Pasep/Cofins) para a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), pode gerar uma alíquota de 12% sobre os serviços e prevê o fim da isenção tributária dos livros.

De acordo com a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 150, inciso VI, alínea “d”, “é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão”. Além disso, desde 2004 o mercado editorial é isento do pagamento de PIS e Cofins. As medidas garantiram maior atratividade no preço dos livros ao decorrer dos últimos anos, mesmo com os baixos índices de leitura dos brasileiros. Com a proposta do Executivo, encabeçada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, entretanto, a taxação de 12% deve encarecer o produto e prejudicar o mercado editorial brasileiro, que tem sofrido com a queda de vendas desde o início da recessão econômica, em 2015, e foi profundamente afetado com a pandemia do coronavírus.

Ao portal Deutsche Welle, o presidente da Associação Nacional de Livrarias, Bernardo Gurbanov, afirmou que caso o projeto seja aprovado da forma como está, o valor das obras sofrerá aumento. “É preciso considerar que esse imposto tem um efeito cascata sobre a cadeia econômica do livro. Estimamos que a mudança possa aumentar o preço final em até 20%", disse ao portal. Um levantamento do Painel do Varejo de Livros no Brasil mostrou que em abril, no início da pandemia, o setor registrou uma queda de 47% no faturamento em relação ao mesmo período de 2019. Entre maio e junho o setor teve uma recuperação, mas a situação de crise permanece.

Para Carlos Magno Soares, a possível taxação do mercado editorial é um retrocessoDe acordo com o advogado e especialista em direito tributário, Carlos Magno Soares, a proposta do Governo, caso seja aprovada, irá prejudicar vários setores. “A possível taxação pela CBS é ruim de modo geral, tanto para o mercado editorial quanto para a população. Os livros são meios de educação, da básica ao ensino superior e profissional”, afirma Soares. “A mesma população que hoje se beneficia do Bolsa Família vai estar estudando em algum momento, ou então os filhos, e essa taxação vai prejudicar a educação e a melhora de vida dessas pessoas em termos econômicos e profissionais”, lembra, sobre a fala de Guedes sobre a destinação para o Bolsa Família dos recursos arrecadados com a taxação do mercado editorial. “É um retrocesso”, conclui Soares.

Segundo Guedes, a isenção dos livros beneficia a camada mais rica da população: as elites. “Uma coisa é você focalizar a ajuda. Outra coisa é você, a título de ajudar os mais pobres, na verdade, isentar gente que pode pagar”, disse o ministro, em audiência no Congresso Nacional em 5 de agosto. O argumento de Guedes é que os livros são muito mais procurados pelos ricos do que pelos pobres. “Num primeiro momento, quando fizeram o auxílio emergencial, estavam [os pobres] mais preocupados em sobreviver do que em frequentar as livrarias que nós frequentamos”, disse na ocasião.

A proposta de taxação dos livros tem enfrentado críticas de vários setores. Senadores de partidos de oposição, entre eles o do Paraná, Flávio Arns (Rede), alertaram que o fim da isenção pode aprofundar a crise no setor editorial. A União Brasileira de Escritores (UBE) também se manifestou contrária ao projeto. “A maior prejudicada pela inoportuna e anacrônica tributação seria uma pátria chamada Brasil, que somente estará de fato acima de tudo se não transformar o conhecimento em privilégio apenas da elite”, alertou a entidade.

A argumentação de Guedes sobre o fato de “o livro ser um produto da elite” e que por isso deveria ser taxado não faz sentido. O projeto que cria a CBS com alíquota de 12% para diversos setores beneficia bancos, planos de saúde e seguradoras com uma porcentagem de contribuição menor, de 5,8%. Além disso, ao taxar o mercado editorial, o Governo estará promovendo um desestímulo à leitura em um país que já lê pouco. De acordo com a edição mais recente do Instituto Pró-Livro, de 2016, cerca de 44% da população não é leitora. E para aqueles que leem, a média de leitura é de 2,43 livros/ano. “O nível de leitura já é extremamente baixo com o preço que nós pagamos hoje. Se o valor aumentar, o que certamente irá ocorrer, já que as editoras vão repassar os custos, esse nível poderá diminuir”, opina Carlos Magno Soares.

De acordo com o ministro, o Governo criaria com o valor arrecadado sobre o mercado editorial, um programa de distribuição gratuita de obras para os mais pobres, que também serviria para o aumento do programa social Bolsa Família, o qual o Governo tenta ampliar como futuro Renda Brasil. Essa proposta, que não foi aprofundada pelo ministro, coloca no poder do Estado a decisão sobre o que a sociedade deverá ler. Quem decidirá quais livros serão doados? Quais serão os critérios? Por que uns e não outros? Isso servirá apenas para atender ao governo de ocasião e contribuirá para o aumento da crise do setor, principalmente envolvendo pequenas livrarias. A isenção tem como base justamente evitar a censura sobre determinadas obras, algo que especialistas temem que ocorra com a ideia do ministro.

Em um país extremamente desigual, que necessita de fortes avanços na educação e no fortalecimento de sua cultura, a taxação de livros demonstra um pensamento simplista e a curto prazo. Os livros não devem ser artigos de luxo e muito menos de uso exclusivo das elites, mas sim ferramenta para o desenvolvimento da nossa sociedade, com poder de reduzir a desigualdade social e oferecer oportunidade para aqueles que enxergam no conhecimento a possibilidade de mudar o país.

O Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita do Estado do Paraná (Sindafep) é contra a proposta do Governo por acreditar que ela pode aprofundar o cenário da desigualdade no Brasil, ao passo de que apenas a simplificação tributária não é suficiente para promover as mudanças necessárias ao país. Se a taxação dos livros é para atingir a elite, por que não tributar as grandes fortunas?
 

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